Quase um mês depois de terem sido conhecidos os três projetos finalistas para a nova ponte que irá ligar Santo Ovídio, em Gaia, à Casa da Música, no Porto, o debate organizado pela Ordem dos Arquitetos Secção Regional do Norte (OASRN) tinha como objetivo “abrir espaço para o diálogo”, afirmou a presidente do conselho diretivo, Maria Conceição Melo.
“O debate não pretende focar-se na questão do projeto ou concurso, mas noutras questões estratégicas que já deviam ter sido discutidas”, observou.
Apesar da intenção, o debate focou-se, sobretudo, no caderno de encargos, na cota da infraestrutura e na sua intersecção com Gaia e Porto, tendo até sido proposta a hipótese de anulação do concurso de conceção.
Para a vice-diretora da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP), Teresa Cálix, as propostas apresentam “uma total desconsideração pelo polo do Campo Alegre”, zona onde se insere a instituição e que “carece de uma solução unificadora”, a qual é “agravada pela proposta do metro”.
“Fizemos uma tentativa em abril para resolver este assunto de outra forma”, disse a responsável, defendendo que a nova ponte “terá um enorme impacto sobre o valor cultural e paisagista” ao aterrar, na cidade do Porto, a nascente da Quinta da Póvoa e passar sobre a via panorâmica resvés entre a Casa Agustina Bessa Luís e a Casa Cor de Rosa.
Também Edgar Brito, investigador do Centro de Estudos de Arquitetura e Urbanismo da FAUP, defendeu existir “falta de escrutínio público” e considerou que a nova ponte se trata de um “atentado urbanístico e de mobilidade” tanto ao nível das interceções, como ao nível da sua cota, superior à da Ponte da Arrábida.
“Esta é a oportunidade de corrigirmos este erro. Ainda não perdemos dinheiro, nem património”, disse o investigador, questionando o presidente da Metro do Porto, Tiago Braga, se estava disponível para anular o concurso.
Já Paulo Farinha Marques, professor da FAUP, disse não estar “convencido com a solução”, nem com a sua “pertinência”, defendendo que o polo do Campo Alegre — onde se inserem quatro das 14 faculdades da U. Porto – continua a ser “um espaço urbano profundamente medíocre”.
Por outro lado, o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues, que lamentou a “visão porto centrista” envolto da infraestrutura, defendeu que os políticos “não têm de se meter” em questões técnicas, lembrando, contudo, que o concurso surgiu “num tempo em que a contratação pública obriga a fazer cadernos de encargos híper fechados”.
“Todos os concorrentes sabiam ao que vinham”, reiterou, acrescentando que se está a tentar “fazer uma obra de referência”.
Eduardo Vítor Rodrigues salientou, contudo, que “assinava por baixo” de uma proposta que baixasse a cota da nova infraestrutura e que fosse ao encontro da VL8, lembrando, no entanto, que os custos associados são “insustentáveis”.
Também o vereador do Urbanismo da Câmara do Porto, Pedro Baganha, lamentou que as autarquias sejam sempre “o filho de deus menor” nestes processos, considerando que, apesar de a solução “ter problemas”, o valor patrimonial será defendido.
“Face à necessidade de avançarmos neste processo, reconhecendo que há imperfeições no processo e matéria que tem interesse em ser ajustada, valia a pena para o desenvolvimento deste projeto termos um grupo que o acompanhasse, onde poderia ter assento a U.Porto”, sugeriu.
A sugestão foi aceite pelo presidente da Câmara de Gaia, como pelo presidente da Metro do Porto, Tiago Braga, que lembrou, no entanto, que a criação de um grupo de acompanhamento já é “uma prática” da empresa.
Face às inúmeras questões que foram levantadas, Tiago Braga salientou que a “decisão não foi tomada dentro de portas” e que a Metro do Porto vai reforçar ao vencedor do concurso a obrigação de “olhar para o território como um território singular que permita cerzir”, rejeitando, no entanto, a anulação do concurso e a reversão do caderno de encargos.